domingo, setembro 30, 2007

Copa do Mundo

O Brasil sagrou-se vice-campeão mundial de futebol feminino na manhã deste domingo. A equipe brasileira perdeu de dois a zero para a alemã. Num país em que o segundo e o último lugar em competições esportivas costumam ter significados iguais, poderíamos encarar como negativo o resultado de hoje. Toda derrota é negativa, por óbvio. Mas na competição que se encerrou nesta manhã, mais do que a derrota na final precisa ser enaltecida a conquista do vice-campeonato. Digo isso porque, em primeiro lugar, pela primeira vez na história uma seleção brasileira feminina de futebol disputou uma final de Copa do Mundo. Acima disto, é preciso atentar para o fato de que o futebol feminino, no Brasil, simplesmente não existe. Durante a transmissão da Band, fiquei sabendo que nos últimos quatro anos, período de preparação para o mundial, a seleção brasileira disputou apenas 3 amistosos, enquanto que a Alemanha, bi-campeã, e os EUA, terceiro colocados, disputaram mais de 50. O total desprezo para com o futebol feminino no Brasil transforma o resultado desta manhã num fato histórico. Mais do que isso, eleva as atletas brasileiras ao panteão dos heróis do nosso esporte. A CBF anuncia a realização da primeira Copa do Brasil de futebol feminino. A iniciativa, ainda que com anos de atraso, merece todo o apoio da mídia. A igualdade entre os sexos, assegurada constitucionalmente, torna obrigatória a mobilização em prol do incentivo e do apoio ao futebol feminino no Brasil. O estigma de que o futebol é esporte exlcusivamente para homens, ainda bastante presente na nossa sociedade, merece ser derrubado em favor da difusão de mais uma modalidade esportiva na qual o Brasil revela forte propensão ao sucesso. Seguir estigmatizando ou dando conotoção sexual pejorativa ao futebol feminino é atitude que precisa ser erradicada imediatamente da nossa sociedade. A conquista de hoje de manhã pode representar o marco dessa mudança.

sábado, setembro 29, 2007

Carta do Padre Antônio Vieira à Lula e FHC

Prezados presidentes,

Face aos acontecimentos que se acumulam ao longo desses 13 anos de governo de Vossas Excelências, acabei sendo acordado abruptamente de meu sono eterno. Assim que despertei, deparei-me com o inferno em que se transformou esta província. Ante tais fatos, senti a irresistível necessidade de escrever-lhes esta missiva, por meio da qual ouso fazer-lhes um alerta. Vossas Excelências parecem desconhecer o fato de que nem os governantes podem ir ao paraíso sem levar consigo os ladrões, nem os ladrões podem ir ao inferno sem levar consigo os governantes. Mas, sobretudo, parecem desconhecer o fato de que em todos os governos do mundo é tanto pelo contrário, que em vez de os governantes levarem consigo os ladrões ao paraíso, os ladrões são os que levam consigo os governantes ao inferno.Deveriam aperceber-se de tais fatos Vossas Excelências. Deveriam olhar no entorno e avaliar se os homens que elegeram para os ofícios o foram por merecimento. Digo isso porque, já dizia Cristo, que a porta por onde legitimamente se entra ao ofício é só o merecimento; e todo o que não entra pela porta não só diz Cristo que é ladrão senão ladrão e ladrão. O que entra pela porta poderá vir a ser ladrão, mas os que não entram por ela já o são. Uns entram pelo parentesco, outros pela amizade, outros pela valia, outro pelo suborno, e todos pela negociação. E quem negocia não há mister outra prova; já se sabe que não vai a perder. Soube de declarações de Vossas Excelências a respeito de certos ladrões que maculam vossos governos: dizem que nada sabem, que nada sabiam. Ora, como se pode escusar quem ao menos firma os provimentos de que não conhecia serem ladrões os que por estes meios provados? Ou os conhecia, ou não. Se os não conheciam, como os proveram sem os conhecer? E se os conheciam, como os proveram conhecendo-os? Dos fatos, Vossas Excelências correm o risco de serem tachados de infiéis, companheiros de ladrões. Companheiros de ladrões porque os dissimulam; companheiros dos ladrões porque os consentem; companheiros dos ladrões porque lhes dão os postos e os poderes; companheiros dos ladrões porque talvez os defendam; e são finalmente seus companheiros porque os acompanham e hão de acompanhar ao inferno, onde os mesmos ladrões os levam consigo. Por tudo isso, vos alerto. Vos alerto para o risco que correm, para os perigos a que submetem este povo.

Do Sermão do Bom Ladrão,1655

quarta-feira, setembro 26, 2007

O Incêndio

Jörg Friedrich é um historiador alemão. Como historiador, escreveu um grande livro sobre o episódio mais triste da história não apenas de seu país, mas da humanidade. O Incêndio é uma leitura pesada, dolorosa. A nacionalidade do escritor poderia levantar suspeição sobre o enfoque dado aos fatos, mas ao longo das 535 páginas constatamos que o autor não pretendeu expor com minúcias apenas a dor a que foi submetida a nação alemã durante a segunda guerra mundial, mas revelar até onde o ser humano consegue ir em matéria de crueldade.

O livro não guarda qualquer indício de maniqueísmo. Muito antes pelo contrário, ressalta o quanto, num intervalo de 6 anos, as principais nações do planeta submeteram milhões de civis ao flagelo da guerra das bombas incendiárias. No decorrer da leitura, Friederich nos transporta para as ruas, casas, hospitais, conventos, igrejas, museus, bibliotecas, orfanatos, kellers e bunkers das cidades alemãs duramente bombardeadas na Segunda Grande Guerra. Nos mostra como os aliados, sobretudo os ingleses de Churchil, feridos pelos bombardeios das forças hitleristas, adotaram o extermínio frio e indiscriminado de uma população inteira em prol da rendição do exército nazista.

A lógica do "quem atacou primeiro" serviu de mote para tática de cozinhar milhões de cidadãos alemães, punidos pelo pecado de terem legitimado no poder um dos mais sanguinários Chefes de Estado já produzidos pela espécie humana. O inferno produzido pelas bombas incendiárias não discriminava civis ou militares, alemães ou estrangeiros, adultos, idosos ou crianças, todos eram alvo da força invencível dos bombardeiros aliados. A literatura e o cinema sempre deram maior destaque ao holocausto judeu ou ao sofrimento das vítimas inglesas e francesas. Friedrich subverte a lógica de que a história é contada pelos vencedores. Sem deixar de tocar firme na ferida nazista, o historiador detalha com riqueza o genocídio dos civis alemães, sem medo de se expor a eventuais acusações de parcialidade.

No último capítulo, após descrever o quanto os bens culturais do povo alemão foram devastados na guerra, o autor conclui o livro com o seguinte parágrafo:"A guerra incendiária não se apossou do papel na medida em que se poderia supor em razão da sua natureza altamente inflamável, ainda que o tenha eliminado em quantidades antes nunca vistas. Entretanto o papel irá dela se apossar, pois tem mais fôlego do que o fogo". O Incêndio é leitura obrigatória para quem pretende descobrir que, na guerra, os únicos heróis, e verdadeiros vencedores, são os civis que conseguiram sobreviver à barbárie.

quarta-feira, setembro 12, 2007

Quarenta

Quarenta é um número simbólico. Pois foram quarenta...quarenta...quarenta senadores que absolveram Renan na tarde de hoje. Esses quarenta, sob o conveniente escudo do voto secreto, ficaram à vontade para, protegidos do posterior julgamento da opinião pública, absolverem Calheiros. Este, como é vergonhosamente comum na história do nosso país, dá a volta por cima, absolvido, aparentemente imaculado. Não importa que ainda existam duas representações a serem julgadas no Senado, pois com certeza Renan renunciará ao cargo para expurgar de vez a ameaça de cassação. Quarenta a trinta e cinco é um escore apertado o suficiente para evitar que o risco de dois novos julgamentos se concretize na indesejável cassação. A história já está escrita: Renan renuncia, recupera o mandato na próxima eleição e tudo volta a ser como antes. Talvez Renan esteja bebendo champagne a essas horas, reunido com seus quarenta , jogando vaquinhas de papel para o ar, enquanto nós, cidadãos brasileiros, nos preparamos para descansar de mais um dia normal de trabalho.


terça-feira, setembro 11, 2007

Esquizofrenia

No site da Scientific American, li que muitas variantes gênicas ligadas à esquizofrenia foram selecionadas pela evolução e permaneceram praticamente inalteradas, o que indica que poderiam trazer alguma espécie de vantagem para o organismo humano.

O mesmo artigo revela que 1% da população norte-americana é esquizofrênica, estatística cuja credibilidade é ameaçada quando atentamos para o fato de que essa mesma população elegeu e reelegeu George W. Bush para a Casa Branca.

A esquizofrenia é uma patologia mental caracterizada, dentre outros sintomas, por provocar uma desorganização cognitiva na mente dos portadores. Desorganização cognitiva que justificaria a votação em George W. Bush.

Não tenho conhecimento acerca do percentual de esquizofrênicos que decidirão o futuro de Renan Calheiros na votação marcada para amanhã. Não será por desorganização cognitiva de nossos senadores que o Presidente do Senado será absolvido. Muito menos por um crise de alucinação coletiva dos votantes. Somente a canalhice que apodrece as entranhas do legislativo federal justificará uma eventual absolvição. Canalhice que nos faz desejar transcender a realidade política. Realidade política que somente por razões semânticas não se interpreta como uma vergonhosa crise institucional.

segunda-feira, setembro 10, 2007

Família Goulart vs. EUA

A viúva e dois herdeiros do ex-presidente João Goulart demandam contra os Estados Unidos da América do Norte pleiteando indenização por danos morais, patrimoniais e à imagem em decorrência da participação daquele país no golpe militar de 1964. Em 1ª instância, o TRF da 2ª Região julgou extinto o processo sem resolução de mérito por impossibilidade jurídica do pedido, sob o entendimento que o ato do governo americano possui natureza de império. As partes interpuseram Recurso Ordinário perante o STJ, o qual encontra-se pendente de julgamento, enquanto os ministros decidem se o ato foi de império ou de gestão. Os ministros Naci Andrighi e Humberto Gomes de Barros interpretaram a participação americana como ato de gestão, votando pelo provimento do RO. Já o Ministro Aldir Passarinho Júnior divergiu do voto da relatora, entendendo a participação norte-americana como ato de império. A natureza do ato é decisiva para julgamento de procedência ou improcedência da pretensão dos autores, haja vista que os atos de império, por serem atinentes a questões de soberania, gozam de imunidade jurisdicional, enquanto que os atos de gestão, por dizerem respeito a atividades de interesses particulares, sujeitariam a nação ré a uma eventual condenação.

Segundo o direito internacional, atos de império são aqueles nos quais o Estado atua em nome da sua soberania, como os decorrentes das atividades diplomáticas e consulares. Atos de gestão são aqueles despidos das ordinárias funções diplomáticas, praticados em prol de interesses unilaterais.

Com relação ao golpe de 64, ao financiar os militares golpistas, inclusive enviando navios de guerra para o litoral brasileiro, motivados pela neurose anti-comunista, sujeitando uma nação estrangeira à barbárie que se seguiria nos anos de chumbo, evidente o dever de indenizar as vítimas de tal ato.

Se a moda pegar, o rombo que a Viúva herdou em função da violência militarista poderá ser compartilhado com o império do norte.