domingo, julho 30, 2006

A mulher de César

"Não basta ser honesto, é preciso parecer honesto". Se você ainda não sabe em quem vai votar nas eleições de outubro, este blog pretende ajudá-lo a definir, ao menos, em quem você NÃO DEVE VOTAR. A partir de hoje, com o auxílio da Transparência Brasil, o blog disponibilizará informações a respeito de candidatos que sejam alvo de processos judiciais e/ou investigações do Ministério Público por envolvimento em casos de corrupção. Através dessa iniciativa, o Blog do Chico manifesta firme convicção de que em um país de corrupção endêmica como o nosso, com relação à candidatos à cargos políticos, o princípio da presunção de inocência deve ser relativizado. No próximo post pretendemos divulgar as primeiras informações. Não obstante, se você tiver interesse em acessar o banco de dados que será por nós consultado, acesse o site www.transparencia.org.br

Chega de circo

Após quase um mês de desatualização, o blog pretende, a partir desta data, voltar a estar conectado com o que se passa ao seu redor. Chega de circo, voltemos à dura e crua realidade!

domingo, julho 02, 2006

Deus é português e Felipão é brasileiro

Grandes Poetas: Fernando Pessoa


O mistério das coisas, onde está ele?
Onde está ele que não aparece
Pelo menos a mostrar-nos que é mistério?
Que sabe o rio disso e que sabe a árvore?
E eu, que não sou mais do que eles, que sei disso?
Sempre que olho para as coisas e penso no que os homens pensam delas,
Rio como um regato que soa fresco numa pedra.
Porque o único sentido oculto das coisas
É elas não terem sentido oculto nenhum.

Alberto Caeiro

Paradise Now

Existe solução para o conflito israelo-palestino? O velho clichê “tudo tem solução, exceto a morte”, responde a pergunta. Sim, há solução. Mas qual é essa solução? Através de um raciocínio simples, desconsiderando os inúmeros fatores que tornam complexa a solução do problema, podemos resolver a questão chegando à conclusão que a única saída seria acabar com as sucessivas e recíprocas retaliações. Se dependesse do povo israelense e palestino, considerados estes enquanto pessoas comuns, preocupadas única e exclusivamente com a garantia de uma vida pacífica e sem conflitos, a guerra já teria acabado há muito tempo: o palestino e o judeu comum não vêm motivos para odiarem-se mutuamente, estão mais interessados na vida, na co-existência pacífica. Ocorre que, embora estes constituam a maioria da população, os donos do poder, cujo caráter constitui-se em um amálgama de fascismo, conservadorismo, oportunismo e extremismo psicótico, dificultam o fim da guerra. Como pano de fundo, como estratégia de manobra, se valem da ortodoxia religiosa. São os fundamentalistas judeus e muçulmanos, aliados à interesses político-financeiros, que se aproveitam do desespero do povo – entre os palestinos, o desespero em meio à miséria, enquanto que entre os judeus, o medo em meio à pujança material. Enquanto os extremos comandarem, o equilíbrio continuará distante. Paradise Now , filme realizado por cineastas palestinos, conta a estória de dois “mártires de Alah”, na iminência de um atentado terrorista. O filme mostra os bastidores de um ataque de homens-bomba, revelando desde a estratégia de convencimento até o substrato psicológico que motiva uma missão suicida. Num dado momento, quando estão rumando para o ataque, um dos protagonistas questiona o arregimentador sobre o que acontece depois do cumprimento da missão. De imediato, este responde que dois anjos virão para levá-los ao paraíso. O futuro mártir pergunta se ele tem certeza disso. Um pouco nervoso, sem coragem de mirá-lo nos olhos, responde com um incisivo “É claro!”. O filme não apresenta soluções mágicas para o conflito, mas deixa claro que, com exceção dos lunáticos e dos oportunistas, a maioria dos palestinos não vê o terrorismo como a melhor alternativa para acabar com a opressão israelense.

Ludovico, o ingênuo

Após várias semanas de sono leve e tranqüilo, Ludovico não conseguiu pregar o olho na madrugada de hoje. O balãozinho do Zidane sobre o Ronaldinho “Gordo” Nazário, em imagem digital de alta definição, com a fabulosa melodia da Marselhesa em som digital ao fundo, além de trazer a insônia de volta, levou-o a pensar no tão falado padrão japonês de tv digital. Ludovico não entende o porquê de tanta malhação a respeito da escolha feita pelo governo brasileiro. Ludovico agradece mais uma vez à Lula, cada dia mais firme na condição de “nosso pai”, por garantir que nunca os pobres brasileiros terão acesso às benesses da tv digital. Temos de comemorar o fato de que as grandes beneficiadas pelo sistema escolhido serão as grandes empresas de televisão, as únicas capazes, segundo os termos do decreto, de usufruir do espectro de freqüência digital. Ludovico sente-se aliviado pelo fato de que a tv digital não significará uma maior democratização dos meios de comunicação social no Brasil, pois, afora os quatro canais públicos que serão criados, não será dado espaço para uma proliferação de pequenos canais de tv: nós, os pobres brasileiros, seguiremos excluídos das nefastas atrações televisivas. Ludovico temia que a implantação da TV digital no Brasil o tentasse a abandonar as suas leituras em troca de horas e horas de hipnose televisiva. Ludovico não tem dinheiro para trocar a sua tv-de-14 polegadas-tela oval, portanto, sente-se à salvo das tentações digitais. Ludovico ainda não leu o decreto do Lula, mas está curioso para saber se o pai dos pobres assegurou a instalação da tal fábrica de semicondutores no Brasil. Apesar de não ter lido, Ludovico tem certeza que o “seu pai” não assinaria o contrato se essa condição não tivesse sido garantida pelo japoneses. Afinal de contas, Ludovico, apesar de não gostar de televisão, nem de se deixar seduzir pelas tão enaltecidas qualidades da tecnologia high tech, não vê a hora de conseguir um bom emprego. Depois da assinatura do decreto, Ludovico já definiu seu voto: votará em Lula pois, graças a ele, nunca terá o desgosto de ver os fiascos da seleção brasileira em imagem digital. Já os ricos, coitados, não podem dizer o mesmo.

sábado, julho 01, 2006

Não se ufane do seu país

O circo acabou. Novamente os franceses nos expulsaram do picadeiro. Deveria estar me sentindo triste ante à prematura eliminação brasileira. No entanto, o sentimento que se apossa de mim após o vexame de Frankfurt é um misto de melancolia, pessimismo e indignação. Não sou daqueles que se ufanam do meu país. O slogan lulo-fascista do “Sou brasileiro e não desisto nunca” sempre soou piegas em meus ouvidos. A vida não se resume ao futebol, nem a conquista da Copa serviria de panacéia para os males da pátria, muito embora tenha certeza de que o governo , como de costume, utilizaria o hexa como sinal de que o Brasil está dando certo. A vida não se resume ao futebol, mas o desempenho pífio de nossos jogadores serve para compreendermos um pouco a personalidade brasileira. A seleção brasileira entrou nessa Copa com a plena convicção de que inevitavelmente seria a campeã. Nossos jogadores são os melhores, os mais talentosos. Os dois melhores times da Copa eram o titular e o reserva do Brasil. Há dois anos Ronaldinho Gaúcho é o melhor jogador do planeta. Ronaldo “Gordo” Nazário é o maior artilheiro da história das copas. Kaká é o melhor jogador da melhor equipe da Itália. Juninho Pernambucano é o melhor jogador da melhor equipe da França. Ronaldinho Gaúcho e Ronaldo Nazário são, respectivamente, os dois melhores jogadores dos dois melhores times da Espanha. Marcelinho Paraíba, que nem sequer foi convocado, é o melhor jogador da Alemanha. Zagallo é o técnico com mais títulos mundiais. Com toda essa abundância de talentos, os jogadores brasileiros tinham a convicção de que, inevitavelmente, e sem esforço, a Copa acabaria caindo em suas mãos. Com essa certeza, para que se esforçar, para que correr o risco de uma lesão, para que se extenuar em campo? Somos os melhores, sendo os melhores, sendo os mais talentosos, não precisamos de esforço para conquistar os nossos objetivos. Para que estudar para a prova, se sou inteligente? Para que se preocupar com as eleições, se todos os políticos são iguais, e as coisas não irão mudar de qualquer forma? Para que me desgastar lendo um livro, se ele não vai me encher a barriga, nem me fazer ganhar dinheiro? Por que não votar no Lula, se ele me garante ao menos R$90,00 de bolsa-família? Para que trabalhar, se meu pai é rico? O brasileiro é alegre, é esperto. Nosso país é rico em recursos naturais. Nosso país é o mais belo do globo. Não temos furacão nem terremoto. Deus, afinal de contas, é brasileiro, haja o que houver, tudo vai acabar dando certo, para que se preocupar? De que adianta protestar contra os políticos, se isso “não dá em nada”? “Caixa dois? Estão fazendo tempestade em copo d´água. Isso é intriga da oposição. Todos os partidos sempre usaram caixa dois”. Corrupção? A culpa não é nossa, é do sistema, não tem como mudar. “Nos acusam de corruptos, eles não se enxergam?” Futebol, futebol é arte, não é um mero esporte. Mais importante que o resultado é jogar bonito.

Senti vergonha após a derrota de hoje. Mas esse sentimento de vergonha não teve nada a ver com o futebol em si. Senti vergonha por ver refletido na nossa seleção a pior da personalidade brasileira. A imagem do conformismo, da preguiça, da acomodação, da soberba, da falta de iniciativa, da auto-enganação, da falta de espírito vencedor, da megalomania, da auto-ilusão, da mediocridade, da covardia, do estúpido “jeitinho brasileiro”. Me perdoem se estou sendo ranzinza. Mas não me chamem de pessimista, nem de antipatriótico – acho ridículo o tal do patriotismo. Quero deixar claro, antes de encerrar, que todas essas características mencionadas não resumem o verdadeiro espírito brasileiro. Se foram elas que afloraram após o fiasco da seleção verde-amarela, algumas horas antes, através da seleção portuguesa, o Felipão, um brasileiro que merece o nosso orgulho, mais uma vez mostrou qual o caminho que devemos trilhar para conquistar nossos objetivos: com talento, sem dúvida, é mais fácil. Mas só o talento não basta, é preciso muito trabalho. Portanto, agora que o circo acabou, não nos esqueçamos do exemplo do Felipão: muito trabalho e superação, só assim é possível vencer na vida.

Habana Blues

Não deixe de assistir à Habana Blues, filme cubano co-produzido pela rede TVE (Televisón Española). Aqueles que ainda imaginam que a ilha de Fidel é um paraíso, após assistir ao filme, sofrerão uma forte decepção. Apesar disso, alerto aos mais empolgados que o filme não faz apologia do capitalismo, nem constitui-se em libelo à favor da ampla abertura do regime castrista. A história é simples, simplória até: os protagonistas são músicos em busca da remota oportunidade de conseguirem viver de sua arte. Em meio à crises familiares, decorrentes diretamente da miserável economia cubana, os dois são seduzidos por uma chance de assinarem contrato com uma produtora espanhola, a qual subsidiaria turnê e produção de disco na Europa. A simplicidade do enredo acaba permitindo que venha à tona o conteúdo real do dilema cubano. Mas não espere respostas, a proposta do filme é a reflexão. Cuba não é um paraíso, muito embora poderia ter sido. Cuba não é o Haiti, mas pode vir a se tornar. A mensagem do filme, segundo a leitura que fiz, pode se resumir ao seguinte: a liberdade é o nosso maior bem mas, justamente por isso, ela não tem preço. O que é pior, ser escravo do Estado, ou ser escravo do capital? Rui e Tito, os dois protagonistas do filme, fazem escolhas diferentes. Em um diálogo marcante, o qual transcrevo de forma não-literal, os dois revelam para o espectador o que significa ser cubano e viver em Cuba nos dias de hoje:

Tito: “Tenho 28 anos, e nunca pude sair desta maldita ilha!”

Rui: “ De que adianta sair, em troca de virar escravo dessa empresa estrangeira?!”

Tito: “Mas e aqui, também somos escravos!”

Rui: “Mas aqui, ao menos, somos escravos de nós mesmos!”

A liberdade é tudo. A liberdade é tudo, mas no momento em que optamos por vendê-la para outrem, ainda que não percebamos de imediato, a perdemos para sempre. O povo cubano precisa de liberdade. Mas como encontrar a liberdade e não se tornar um haitiano?